|  | 
    o ato sexual é no tempo o que o 
    tigre é no espaço 
    georges 
    bataille 
 pernas abertas num ângulo
 de asa avulsa de um arcanjo.
 
 no intermeio a pentelheira
 cuja flor é licoreira
 
 – o gineceu como um grilo
 que, gritinhos por estrídulo,
 
 de corolas dissolvidas,
 decanta o néctar-saliva –
 
 que convida ao fundo bosque
 onde um triste tigre morre.
 
 
 
 
    ao meu 
    assassino 
    
    há muito equívoco nestacidade
 sobre a morte de paulo leminski.
 morreu de bebida, de curitiba,
 de harakiri e o diabo.
 
 deixe-me dizer-lhe
 leminski está morto e fui eu
 que o matei.
 era tardinha, sete de junho
 de 89, na esquina do stuart.
 eu tinha apenas dez anos de idade.
 
 abracei-o no golpe da faca
 e só largaria
 depois que ele se largasse. olhou-me,
 exepcionalmente, com olhos de
 cachorro manso e disse: "quem é vivo
 sempre desaparece."
 sorriu-me como se eu morresse.
 por quê sabia que aquilo
 era obra de um tigre...
 hoje entendo a razão
 de não ter cabido um "sinto muito,
 poeta!"
 é a ordem natural das coisas.
 leminski também matou seu touro
 e voltou para casa de mãos novas.
 
 comigo
 acontecerá o mesmo.
 não fiz nem 28 anos e já espero
 o golpe do meu vingador.
 tenho esta impressão
 de que ele virá da direita,
 sabendo que sou canhoto em tudo.
 
 morro de medo do menino que
 fala sozinho, possível poeta,
 da menina que penteia os cabelos
 no vento (será poeta?),
 de adolescente no expresso
 que lê a ilíada em pé.
 morro de medo, morro de medo,
 mas não há jeito, é certo como o sábado.
 
 na esquina de casa,
 na saída do barbeiro,
 na volta da banca,
 na fila do banco,
 num estacionamento
 de supermercado, ele estará
 a minha espera.
 inevitável que seja.
 em algum lugar da cidade
 meu assassino esta nascendo.
 
 escute daqui a alguns anos estas palavras:
 "tudo bem,
 cara, eu entendo! perdoe-se como eu me perdoei,
 ou não escreverá sequer um verso.
 
 apenas interceda em meu favor para que eu seja
 enterrado em meu bar preferido.
 só isso. os poetas merecem ser emparedados
 em seu boteco eletivo, assim como as aves
 devem ser sepultadas no ar.
 
 o botiquineiro saberá rezar a minha missa."
 
 não há jeito
 é certo como o sábado:
 tal qual as putas de outros tempos,
 o poeta cora seu rosto com sangue.
 
 o sangue de outros poetas.
 
 
 | 
entrada
| Llibre del Tigre | 
sèrieAlfa
| varia | 
Berliner
Mauer | |  |