[Nelson Ascher]

 

(São Paulo, 1958) Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Desde 1979, colabora, como jornalista literário, em periódicos como Jornal da Tarde e Folha de S. Paulo. Entre 1988 e 1994, foi editor da Revista USP, que fundou. Publicou os livros de poesia Ponta da língua (edição do autor, 1983), O sonho da razão (Ed. 34, 1993, incluindo o livro anterior) e Algo de sol (34, 1996). Seu trabalho como tradutor de poesia está sintetizado no livro Poesia alheia. Os poemas aqui publicados foram extraídos de Algo de sol.

 

[(São Paulo, 1958) Llicenciat en Administració d'Empreses per la Fundação Getúlio Vargas. Des de 1979, col·labora, com a periodista literari, en periòdics com Jornal da Tarde i Folha de S. Paulo. Entre 1988 i 1994, fou editor de Revista USP, que fundà. Publicà els llibres de poesia Ponta da língua (edició d'autor, 1983), O sonho da razão (Ed. 34, 1993, que inclou el llibre anterior) i Algo de sol (34, 1996). El seu treball com a traductor de poesia està sintetitzat en el llibre Poesia alheia. Els poemes ací publicats pertanyen a Algo de sol.]

 

 

Deitada de bruços / De bocaterrosa
Orfeu e Eurídice /
Orfeu i Eurídice

 

 

DEITADA DE BRUÇOS

 

Segundo a pincelada
que, súbito, um calígrafo
traçasse da cerviz
ao cóccix, delineia-se 

no avesso do papel
de arroz em que a tensão
dos músculos transforma
a pele ao retesá-la, 

não tanto uma coluna
dorsal quanto – serpente
cuja intenção jamais
se expõe, salvo no lapso 

entre tocaia e bote –
a hipótese de, em torno
ao próprio eixo, a espinha
se contorcer tão látex 

que, vertebrando sub-
cutânea o cerne imóvel
da mais perfeita inércia,
suponha um coreógrafo 

capaz de destilar,
sem pressa a extrema dança
que, implícita nas formas,
dispensa o movimento.

 

 

ORFEU E EURÍDICE

 

Todo o poema se perdeu,
que estava em meus neurônios antes
,
tão logo foi, poucos instantes
atrás, escrito; ou converteu- 

se em variação menos do seu
tema que de outros, semelhantes,
no desenlace, ao dos amantes
mais arquetípicos – Orfeu 

perdendo Eurídice ao olhá-la –
e a página, sem traço algum do
que imaginei, parece a vala 

comum de quanto seja oriundo
da inspiração, que é sempre rala:
o esquecimento, que é sem fundo.
 

 

#

 

 

[DE BOCATERROSA]

Segons la pinzellada
que, de sobte, un cal·lígraf
traçava del bescoll
al còccix, es projecta

en el dors del paper
d'arròs en què la força
dels músculs tots transforma
la pell en retesar-la,

no tant una columna
dorsal com -una serp
que la intenció mai no
l'exposa, tret del lapse

entre emboscada i bot -
la hipòtesi que, entorn
al seu eix, l'espinada
es contorça tan plàstica

que, tot vertebrant sub-
cutània l'ésser immòbil
de la inèrcia més perfecta,
suposa un coreògraf

capaç de destil·lar
sense pressa l'extrema dansa
que, implícita en les formes,
dispensa el moviment.
 

 

[Traducció de Vicent Berenguer]    

 


[ORFEU I EURÍDICE]

Tot el poema s'ha perdut,
que estava en les neurones ans,
tan de seguida  fou, uns instants
abans, escrit; o va tornar-

se en variació tret del seu
tema que  d'altres, semblants,
al seu final, als dos amants
més arquetípics -Orfeu

perdent Eurídice en mirar-la-
i la pàgina, sense cap traç del
que vaig imaginar, sembla la fossa

comuna del que siga oriünd
de la inspiració, ranera sempre:
l'oblit, que no té fons.

 


[Traducció de Vicent Berenguer]

 

     #

 

| a | entrada | Llibre del Tigre | sèrieAlfa | varia | Berliner Mauer |