Arxipèlag | sèrieAlfa núm. 101

 

 

Imagem: Pere Salinas

 

ARQUIPÉLAGO. Joan Navarro

 

D’après umas pinturas de Pere Salinas

 

1

 

Sangue e resina. E as vespas que fogem e voltam e beijam a chaga, o mel de outro tempo, a pele curtida, o território nu das horas.

 

2

 

Terreno gretado. Turba oxidada que arde sob a memória da lagoa. Pó e fumo. Sequeiro. Bandeira.

 

3

 

Os mapas das terras da noite. Os rios castanhos e os negros insetos perto da nuvem da vida. Isca da imobilidade. Madeira morta. Cinza da água.

 

4

 

O anzol e a seda do ar. Os passos das palavras à porta do deserto. Desbravar o caminho. Seguir a linha da rachadura, as cordas da música subterrânea. A enorme concavidade do corpo: Penetrar: Apalpar as palavras: A simetria do olho e do cometa: A ausência. Apalpar os círculos de terra, o barro que tatua o ofídio, as inscrições sobre o basalto, os excrementos do sentido. Internar-se no terreno do tempo.

 

5

 

Solidificaram-se os líquidos que agora se estendem, se curvam e rodeiam o turvo olhar, o olho do poço e do cilindro. Os contornos da ferida. A flor da ruína. Ao entardecer untas com sebo os mecanismos do poema.

 

6

 

O silêncio das velas desdobradas. E a estrela que pende.

 

7

 

A escrita dos campos no inverno: Faixas de terra quieta: Orografia das mãos calosas. Esta folha triangular do enxadão e o sono da semente insone onde antes era bosque, onde antes era terra arroteada.

 

8

 

O ritmo do eco que carrega as metáforas: O corpo da palavra refletido na medula de um outro corpo transparente: Febre de partícula acesa: Dúvida de ser espinho ou tremor quando desponta o dia.

 

9

 

O espanto do anjo ao anunciar a luz da sombra e abrir-se. As fibras e as dobras. A serena argila que origina a vida. O negro raio. O arquipélago.

 

10

 

Os restos do ar depois da tormenta. Este rio de fuligem junto à fogueira onde arde a vítima ritual que abre a mão e solta uma bola de marfim que se confunde com as lágrimas das coisas: O claro interstício de que lugar? Do corpo do hálito. 

 

11

 

Isso que vês agora é o instante do salpico mineral, as faixas de terreno irisadas na vertente da montanha, o musgo esquecido no corpo do rio: Sombra da matéria que se abandona

 

Valencia, outubro 2009

 

[Tradução: Joan Navarro]

 

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